Eu tenho medo de ser pai solteiro

Eu tenho medo de ser pai solteiro. Essa afirmação deve soar completamente insana para você, considerando as expectativas de gênero da sociedade. Mas você não cresceu na família que cresci, não viveu a vida que vivi, não amou as mulheres que amei. 

Eu cresci em uma família fragmentada: minha mãe teve eu e meu irmão no primeiro casamento (apesar de nunca ter sido casada no papel) e mais uma menina no segundo casamento (com um marido que, novamente, não casou com ela no papel), com um homem que já tinha uma filha de outro casamento (que ele nunca divorciou no papel). Como eu disse, fragmentada. Essa base não foi a das melhores, mas deu o espaço que eu precisava para ser um bom filho (o que, no fim das contas, era o que eu precisava). Pena que eu ia ter que crescer para ser pai. 

E crescer, eu cresci: da escola, até o mercado de trabalho, passando pela faculdade, tive um grande senso de responsabilidade e um medo de relacionamentos que me acompanhou silencioso (ou talvez eu não ouvisse ele) até a época em que cursei o mestrado. Eu, que a essa altura tinha colocado todas as minhas fichas emocionais em minha carreira acadêmica para me sentir validado e aceito, nunca me senti mais sozinho e invalidado em toda a minha vida. Mas eu estava falando sobre ser pai, não é?

Quando percebi o que estava fazendo, e o que queria da minha vida pessoal, comecei a buscar relacionamentos (“nessa economia?” eu ouço você perguntando. Nessa economia, eu respondo). Eu nunca fui traído (que eu saiba), mas como fui usado: fui usado por mulheres que queriam voltar com ex; mulheres que queriam um companheiro, mas não companhia; mulheres que queriam alguém responsável, mas não queriam responsabilidade; mulheres que queriam um homem sério para viver uma aventura. E quando me deparava com a ideia de ser pai nesse contexto, eu tinha medo de ser pai solteiro: que uma mãe dessas me deixasse para cuidar da minha criança sozinho, ou estivesse presente somente fisicamente e mais nada, ou pior - levasse a minha criança embora e me obrigasse a visitá-la a cada duas semanas. 

Eu tenho medo de ser pai solteiro. Mas antes disso, eu tinha medo de ser pai, e antes disso, eu tinha medo de ser. 

Hoje, com as mulheres que amei, a vida que vivi, a família onde cresci, eu sou e, de certa maneira, sou pai (como professor, e como ser humano vivendo nessa terra). Ser pai solteiro não seria fácil, mas eu sei, que só seria.