Tradução de "The morning after I killed myself", de Meggie Royer
- Rodrigo

- 2 de nov.
- 2 min de leitura
Link para o poema original: https://elliesbus.org/morning-killed-poem-meggie-royer
Na manhã depois que me matei, acordei. Fiz o café da manhã na cozinha. Acrescentei sal e pimenta aos ovos e usei meu pão francês para um sanduíche de queijo e presunto. Passei um café com leite e açúcar. Raspei as cinzas da frigideira e limpei a pia. Lavei a louça e dobrei as toalhas.
Na manhã depois que me matei, me apaixonei. Não pela a garota da rua ou por aquela professora da escola. Não pela jogger que via todo dia ou com a moça que estava com sua sacola de compras. Eu me apaixonei por minha mãe, e pela maneira como ela se sentou no chão do meu quarto, segurando cada pedra da minha coleção nas palmas das mãos até que escurecessem de suor. Eu me apaixonei por meu pai, quando ele colocou minha nota em uma garrafa e a mandou rio acima. Por meu irmão, que antes acreditava em unicórnios, mas que agora estava sentado em sua carteira na escola, tentando acreditar que eu ainda existia.
Na manhã depois que me matei, passeei com o cachorro. Observei a maneira como sua cauda se contraía quando um pássaro voava ou como seu ritmo acelerava ao ver um gato. Eu vi também o espaço vazio em seus olhos, quando ele pegou um pedaço de pau e se virou para me cumprimentar, para que pudéssemos brincar, mas não viu nada além do céu no meu lugar. Fiquei parado enquanto estranhos acariciavam seu focinho e ele murchava sob o toque deles como fez uma vez com o meu.
Na manhã depois que me matei, voltei para o quintal dos vizinhos, onde deixei minhas pegadas no concreto aos dois anos de idade, e vi como elas já estavam sumindo. Eu colhi algumas orquídeas, arranquei algumas ervas daninhas e observei a mulher idosa pela janela, enquanto ela lia o jornal com a notícia da minha morte. Eu vi seu marido acender um cigarro e trazer sua medicação diária.
Na manhã depois que me matei, vi o sol nascer. Cada ipê se abriu com perfeição, enquanto o garoto na rua apontava uma única nuvem vermelha para sua mãe.
Na manhã depois que me matei, voltei para aquele corpo no necrotério e tentei convencê-lo de alguma forma. Eu falei sobre as frutas e os corredores, o rio e seus pais. Eu contei a ele sobre o pôr do sol, o cachorro (por deus, o cachorro!) e os ipês.
Na manhã depois que me matei, tentei me “desmatar”, mas não consegui terminar o que comecei.




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